CABEÇA
DE LÍDER

José Luiz Tejon

Eldorado/Estadão - Alimentos bons e baratos para todos exige planejamento de Estado de múltiplos fatores

Publicado em 24/01/2025

Divulgação
“somos a segunda maior carga tributária sobre alimentos industrializados do mundo, 24,4%”, João Dornellas, ABIA

Nosso ouvinte Sidney, do Agroconsciente Eldorado Estadão, nos perguntou sobre esse assunto do abastecimento dos alimentos no país mencionando plano safra, taxas de juros especiais e vendas de alimentos ao exterior. Caro Sidney, esse tema é um dos mais complexos de todos os tempos no mundo inteiro. Mas no Brasil vamos começar pelas partes.

Perguntei ao João Dornellas, presidente da Abia, qual a incidência dos impostos sobre os alimentos e ele me respondeu: “somos a segunda maior carga tributária sobre alimentos industrializados do mundo, 24,4%”. E a indústria brasileira de alimentos e bebidas compra cerca de 60% de tudo que vem da agricultura e pecuária do país.

E eu perguntei a Dra. Adriana Bandeira de Mello, advogada tributarista da Anefac - Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade sobre um estudo feito pela FGV para a CNA que aponta que a reforma tributária traria aumento no preço dos alimentos. Vamos ouvir a Dra. Adriana Bandeira de Mello:

“Pois é, Tejon, é verdade. Apesar do setor agro ter sido muito bem-sucedido em negociar vários regimes especiais para a agropecuária na reforma tributária, a verdade é que no final do dia o que vai acontecer mesmo é um aumento da carga tributária que vai refletir no aumento do preço dos alimentos, o que é o esperado. E isso por quê? Porque atualmente o setor do agro é uma das cadeias econômicas mais desoneradas das que existem no Brasil e com a reforma tributária essa desoneração da cadeia vai ser diminuída. Então por mais benesses que tenha a reforma tributária como a cesta básica, redução da alíquota zero, redução de alíquota de 60%, ainda assim vai ter um aumento efetivo da carga tributária para o setor do agro que vai acabar refletindo no final no aumento dos preços dos alimentos. É isso que vai acontecer porque no final a carga tributária no final da cadeia ela tende a ser maior porque hoje temos uma cadeia muito desonerada, hoje qualquer 1% é muito para a cadeia”.

Então vamos vendo como é complexo esse tema e como não será resolvido com “sacadas criativas momentâneas”. Hoje, principalmente nos alimentos dentro da categoria de “commodities”, ou seja, os grandes itens mundiais, impactados nas bolsas de mercadorias, suas cotações são praticamente internacionais. Por exemplo, o USDA, departamento de agricultura dos Estados Unidos, aponta que haverá um decréscimo na safra norte-americana de soja e milho. Essa informação eleva o preço dessas duas commodities na bolsa de Chicago, e chega aqui na saca da soja e do milho brasileiro. Da mesma forma para as grandes culturas como trigo, café, arroz, algodão, açúcar, etc.

Os preços são também impactados pela variação das moedas. Se o dólar sobe, sobem as mercadorias, exatamente por essa hoje “globalização” dos mercados. Outros fatores são os climáticos, como aqui no Brasil passamos por 4 anos de instabilidades o que diminui a oferta dos alimentos. Quando diminui a oferta, e a demanda se mantém, há impacto nos preços. E quando ocorre o contrário, há uma oferta maior do que a demanda e os preços caem.

Na pecuária da mesma forma, os ciclos de altas e baixas são clássicos. Nos ovos, uma proteína que cresceu muito no consumo e na oferta, viemos de 2 anos atrás de um preço do ovo que não remunerava mais os custos dos produtores, então ocorre um corte na produção, e algum tempo depois assistimos os preços subirem. Idem para a avicultura e suinocultura.

E alguns me perguntam mas e a cerveja, o pãozinho?  Da mesma forma, somos importadores de grande parte da cevada, do trigo e na importação o custo vai direto no dólar, além do que comentei anteriormente a perspectiva da oferta do grão, daquele alimento, versus sua demanda.

Portanto numa visão de um especialista de trading, do comércio dos alimentos, eles conseguem dizer se o ano será bom para quem vende ou bom para quem compra?

Agora temos outros fatores. No setor de hortifruticultura, dos legumes, hortaliças, frutas, que envolvem logística, distribuição, comércio, por exemplo, o Brasil é o terceiro maior produtor de frutas do mundo, nas exportações somos praticamente nada, na casa da 23ª posição internacional, e temos da mesma forma dança dos preços nas questões climáticas, e nos custos da logística, onde petróleo, por exemplo, interfere.

E temos ainda quando acompanhamos os movimentos da Abras, Associação Brasileira de Supermercados, o desperdício é considerável, e as datas de validade fazem parte disso. A nível mundial a FAO informa que 1/3 de alimentos produzidos no mundo vão para o lixo.

Para termos um planejamento estratégico de segurança alimentar no país precisamos de metas de produção de pelo menos os 20 itens de maior impacto na alimentação humana, de um plano de crédito, assistência técnica, armazenagem, e de inclusão de áreas de potencial produtivo ainda não utilizadas. Uma delas, principalmente a agricultura local. Cada cidade brasileira tem condição de desenvolver alimentos locais num plano nacional de cooperativismo e empreendedorismo cidade a cidade. E numa grande metrópole como São Paulo, da mesma forma, agricultura vertical e local fazem parte.

Caro Sidney, hoje 70% da produção brasileira de alimentos fica no mercado interno. E plano safra, taxas de juros oferecidos ao agricultor brasileiro é um dos menores do mundo, não temos seguro rural, irrigação ainda insuficiente, e logística sofrível com custos imensos o que encarece cada quilo de cenoura, ou um ovo da sua originação ao consumidor.

E tudo isso sem esquecer que na área dos insumos, fertilizantes, defensivos, sementes, máquinas, produtos veterinários, ainda temos grande dependência de importações, se não no todo, em partes de tecnologias, o que a cada movimento da moeda impacta nos custos.

Portanto, segurança alimentar de uma nação, o assunto obrigatoriamente exige um plano estratégico de longo prazo e de estado. E que ideias “intervencionistas” sejam totalmente abandonadas. A segurança alimentar brasileira é uma questão de estado.

Da mesma forma Sidney, se trata de um problema que exige solução estruturada de longo prazo, protegendo de forma igualitária tanto agricultores quanto consumidores.

José Luiz Tejon para a Eldorado/Estadão.

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