Eldorado/Estadão - “Se fizermos o que está na declaração dos ministros do G20 Agro restauraríamos o paraíso terrestre - só precisa fazer”
Publicado em 16/09/2024
Divulgação G20/Fórum Internacional da AgropecuáriaO documento gerado no Mato Grosso, G20 Brasil 2024, tem como título: “construindo um mundo justo num planeta sustentável”, onde 84% da extrema pobreza no mundo é rural; (UNGA2023 – e acrescento que nessas circunstâncias se desenvolvem o crime e a ilegalidade ambiental/social, e recrutamentos de facções terroristas por ausência de perspectivas econômicas e de sentido de vida).
Também onde 2,8 bilhões de pessoas não têm acesso a uma dieta saudável, onde 733 milhões de pessoas passam fome, a declaração é uníssona com a Aliança Global contra fome e pobreza se voltando para uma coordenação com a agricultura familiar, que reúne cerca de 550 milhões de pequenos agricultores e famílias no mundo, necessitando do desenvolvimento de mercados locais e internacionais para serem legítimos agentes da segurança alimentar e ambiental do planeta.
Isso, na verdade, significa compreender que a extrema pobreza e a fome estão concentradas exatamente em zonas rurais onde pequenos produtores com terra não têm acesso a tecnologias sustentáveis, e não participam do sistema alimentar, conceito de agronegócio identificado em Harvard, em 1955, pelo prof. dr. Ray Goldberg, nem local, nem internacional. O combate ao desperdício está também na declaração, irrigação, armazenagem e infraestrutura, porém associarmos a pobreza e a fome nas zonas rurais, com o desenvolvimento do mundo, e sem dúvida desenvolver ali fontes de renda sustentáveis significaria um grande e valoroso enfrentamento. Uma causa pela qual vale a pena o engajamento.
Relembrando uma frase do ex-ministro Alysson Paolinelli, candidato ao Nobel da Paz, dizia: “temos no Brasil cerca de 4 milhões de agricultores com terra, mas famintos”.
A declaração pede coordenação financeira internacional, planejamento estratégico “target a target”, participação de todos os stakeholders no CFS (Committee World Food Security) e reconhece a interdependência entre os países, convoca a Organização Mundial do Comércio para regras transparentes de um comércio justo e multilateral, evidencia a palavra “holístico” como um compromisso obrigatório nas ações de todas as cadeias produtivas de suprimentos e trata da segurança alimentar como fundamental para todos.
A contribuição do B20, o grupo empresarial foi registrado afirmando novamente a necessidade do engajamento de todas as comunidades agrícolas e florestais, na busca de soluções financeiras, com cooperação multilateral para realizar uma transição agrícola doravante.
Sustentabilidade, equidade de gêneros, com relevância para a mulher rural, fertilizantes como essenciais, incluindo o desenvolvimento inovador de biofertilizantes locais, onde o biogás a partir de biodigestores tratando os dejetos e resíduos significa um extraordinário salto nessa viabilização, bioinsumos, projetos “antimicrobials” (antimicrobianos), segurança genética, mecanização e agricultura de precisão com inclusão digital.
Quatro prioridades foram estabelecidas na declaração do G20 Agro:
1 – Sustentabilidade da agricultura e do sistema alimentar nos seus múltiplos caminhos.
2 – Melhoramento do comércio internacional contribuindo para segurança alimentar e nutricional do planeta.
3 – Elevar o papel da agricultura familiar, pequenas propriedades, comunidades locais, povos indígenas, como uma ação essencial para a sustentabilidade, resiliência e inclusão social.
4 – Promover a integração sustentável da atividade da pesca, da aquicultura, local e nas cadeias globais de valor, face também aos aspectos sustentáveis dos oceanos e do crescimento do consumo alimentar dos frutos do mar, das águas e de um blue system, sistema azul, onde não deveríamos esquecer das algas.
O documento ressalta a cada ponto a expressão sustentabilidade, inclusão, visão sistêmica, necessidade de “um concerto de esforços viabilizando uma política de investimentos nos países em desenvolvimento”.
As pesquisas científicas e tecnológicas como o Brasil criou e desenvolve são mencionadas como agricultura de baixo carbono e sistemas integrados de culturas, lavoura, pecuária e florestas, bem como os biocombustíveis renováveis e modelos agroflorestais.
A mudança climática percorre toda a declaração, num documento que se for feito e levado à prática, é pleno de caminhos e de clareza do que precisa ser feito, o que de fato seria restaurar o paraíso terrestre. Descarbonizar o mundo.
Mas se conseguirmos unir as agriculturas do mundo ao invés de usar uma contra a outra, acabar com as guerras protecionistas, se conseguirmos criar um sistema alimentar, energético, que integre indústria, comércio, serviços e produção rural, se conseguirmos incluir todos os produtores, com acesso aos mercados, ciência, tecnologia, digitalização, seguro, de fato teríamos sucesso na erradicação da fome, combate a pobreza, e elevação da dignidade de vida e saúde na Terra.
Senti falta de três pontos na declaração:
1 – Não há menção ao sistema cooperativista, por entender que seria o único que poderia viabilizar os anseios acima descritos para os tais 550 milhões de pequenos produtores espalhados no planeta, e os nossos brasileiros, cerca de 4 milhões. O cooperativismo no mundo já reúne mais de 1 bilhão de pessoas, no Brasil deverá atingir 30 milhões de cooperados, na agricultura mais de 1 milhão de agricultores, e onde existe uma boa cooperativa o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) é superior.
2 – Não se tratou do mercado ambiental do carbono, que sem dúvida virá a ser um “produto” com mais valor do que boa parte das commodities hoje, e também por remuneração ao índice de saúde embarcado em cada alimento fruto de sistemas regenerativos, verdadeiros Nutrientes para a Vida.
3 – Não houve correlação dessas ações e investimentos com o crescimento do PIB mundial e sua distribuição per capita, bem como seus efeitos na renda dos cidadãos dos países emergentes e do cinturão tropical do planeta. E viveremos ainda o incremento de mais 1,5 bilhão de seres humanos na Terra até 2050.
Precisamos de “accountability” para que as metas sejam cobradas e nos cobrem. Apesar da expressão “food system” estar colocada com ênfase, recomendaria uma maior clareza e convocação para as “big agro corporations”, as grandes companhias, industriais, comerciais e de serviços (não esquecer do poder da mídia), para maior protagonismo na coordenação justa e ética dos seus “supply chain”, incluindo comunicação dando percepção e valor aos seus originadores rurais.
Então aí fica a declaração G20 Agro, que repercuta nos líderes dos seus países na cúpula G20 próximo, em novembro no Rio de Janeiro. E que apareça o grande maestro para caminhar na “orquestração” desse concerto público/privado, transformando uma cacofonia numa legítima sinfonia pela paz, alimento, energia, biodiversidade, e uma só saúde no planeta inteiro.
Pontos da Carta Magna escrita no Fórum Internacional da Agropecuária um dia antes do G20 Agro estão em total consonância com a declaração dos 20 ministros, onde foi dado uma ênfase ao aspecto do cinturão tropical do planeta Terra como uma zona essencial de desenvolvimento, com o registro da competência científica, empreendedora e de recursos humanos brasileiros para servir ao mundo, e também uma ênfase considerável na Carta Magna foi dada para a união de todas as agriculturas, numa luta contra a polarização e divisão do mundo, e investimentos de um capital internacional consciente ao registrar o plano de conversão de 40 milhões de pastagens degradadas em cultivos sustentáveis, sendo a grande síntese final reverberando a voz do professor ministro Roberto Rodrigues na sua manifestação: “o sistema agroalimentar significa paz”.
Na Carta Magna do FIAP cooperativismo foi também fortemente indicado e salientado, bem como educação e comunicação.
Três ministros brasileiros participaram do G20 Agro: Mapa, ministro Carlos Fávaro. MDA, ministro Paulo Teixeira. Pesca e Aquicultura, ministro André de Paula.
Então só precisa fazer. Vamos fazer?
Como explicava o paraibano Ariano Suassuna: “o otimista é um tolo, o pessimista um chato, sou um realista esperançoso”. Assim também me considero.
Vamos fazer!
José Luiz Tejon para a Eldorado/Estadão.