CABEÇA
DE LÍDER

José Luiz Tejon

Eldorado/Estadão - O país que definiu o “agribusiness” também criou o “indianbusiness”?

Publicado em 02/10/2023

Divulgação.
A empresa Tesla abrindo operações no estado do Novo México, na reserva Nambé Pueblo, e dali instalando uma montadora de moderníssimos carros elétricos.

Com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) não considerando constitucional a demarcação de terras indígenas no Brasil como estava na Constituição com a data de 5/10/1988, e agora com a decisão do Senado contrária ao STF, teremos na questão uma batalha com insegurança jurídica para todos os lados, seja qual for a decisão do executivo.

Mas fiquei curioso com o estado desse assunto hoje no maior país do agronegócio do mundo, os Estados Unidos, onde Ray Goldberg e John Davis da Universidade de Harvard nos anos 50 definiram o conceito de “agribusiness”. Estados Unidos são o maior agribusiness do mundo, a 2ª maior agricultura do planeta, e um território de mais de 9.371 milhões de km2. No Brasil, o 5º maior do mundo, temos mais de 8.515 milhões de km2. E somos hoje a 4ª maior agricultura do mundo e o maior exportador de alimentos industrializados em volume do planeta (Fonte: Abia).

Aqui no Brasil temos cerca de 119 milhões de hectares de reservas indígenas, e a questão que fica em aberto não acatando o marco temporal envolveria aproximadamente mais 10 milhões de hectares.

Nos Estados Unidos hoje existem 22.700.000 há de reservas (2,3% do território norte-americano, com povos originários na casa de 2.5 milhões, com 1 milhão vivendo nas reservas); ou seja, praticamente 19% do território sob reserva no Brasil. Mas o que mais chama atenção é que o assunto é tratado desde 1758, e num último new deal, novo acordo de 1934, praticamente transforma índios em pessoas de negócios. Poderíamos afirmar um “indianbusiness”. Podem cultivar, desenvolver turismo, lojas, museus, postos de gasolina e cassinos. Inclusive com uma curiosidade, nas reservas indígenas é permitido o jogo nos cassinos mesmo em estados onde isso é proibido.

Nos Estados Unidos também são permitidas associações entre índios e não índios, e mais da metade da população de indígenas dos Estados Unidos não vive nas reservas, habita cidades americanas.

O governo norte-americano, a partir desse último new deal, acordo, investiu em infraestrutura, saúde, educação e promove a “self governance”, ou seja, a autogovernança e a emancipação. Também especialistas promovem o estímulo à negócios nas reservas indígenas onde tributos seguem decisões da reserva com legislação diferente das estaduais, como publicado no Bloomberglaw: “a empresa Tesla abrindo operações no estado do Novo México, na reserva Nambé Pueblo, e dali instalando uma montadora de moderníssimos carros elétricos. Então um mega showroom Tesla com venda direta a consumidores, driblando a lei estadual que obrigava a venda ser feita através de dealers. “Na reserva indígena essa lei não vale”.

Com certeza o tema de reservas indígenas no Brasil tem implicações estratégicas imperativas no campo do meio ambiente. E na minha opinião deveria haver uma separação entre esses dois importantes e fundamentais temas nacionais e não vinculá-los quase que exclusivamente a agropecuária nacional. É muito mais amplo e envolve toda a sociedade.

Curiosamente, estive com um cacique na área de Naviraí, Mato Grosso do Sul, e ele me disse: “eu trocaria as 6 mil cestas de alimentos por 6 mil empregos para minha tribo, quero emancipar meu povo”. E visitando outra reserva em Roraima, perto de Boa Vista, pude assistir uma tribo com suporte da assistência técnica estadual e do governo do estado, iniciando produção de vegetais para abastecer a cidade. Eles têm ali 14 mil hectares de reserva. Se usarem as áreas agricultáveis sem derrubar uma só árvore siquer, cerca de 2 mil há, e produzissem alimentos dentro dos fundamentos regenerativos de ilpf, disse a eles: “vocês são ricos, têm um patrimônio imenso nas mãos”.

Portanto, os povos originários merecem toda nossa justa preocupação sob a ética da dignidade humana. Da mesma forma também todos os povos que formam a nossa sociedade tropical mestiça, negros, imigrantes e migrantes que transformaram nossos solos inférteis em solos produtivos e regenerativos, a “brasilidade” (in memorian Domenico de Masi). Temos processos históricos, culturais, totalmente distintos dos Estados Unidos da América. Porém adotamos aqui no Brasil a tradução de agribusiness, o agronegóio. Talvez fosse evoluído humanamente pensando um estudo sobre soluções norte-americanas que pudessem nos servir nessa questão das nações indígenas, a partir de 1934, o “new deal” dos americanos.

De um lado dando dignidade a todos os povos originários, e segurança jurídica a todos, inclusive produtores rurais já estabelecidos há mais de décadas. Por outro, promovendo as riquezas e a emancipação dos povos originários, sem prejuízo a suas culturas e hábitos. E por outro ainda, separando tudo isso do fundamental direito ambiental, doravante o maior patrimônio brasileiro ao lado do nosso agrotropical.

Temos uma revolução criativa tropical nas mãos, bom para todos originários e originários de outras nações nascidos aqui no maior “melting pot” (caldeirão de raças) da terra.

Agroconsciente: revolução criativa tropical com brasilidade. Temos a fórmula!

José Luiz Tejon para a Eldorado/Estadão.

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