CABEÇA
DE LÍDER

José Luiz Tejon

Devedores x credores: a contabilidade dos vivos!

Publicado em 13/05/2022

José Luiz Tejon Megido

Existem pessoas que vivem suas existências com a profunda convicção de serem os “credores” do universo. O mundo está em permanente dívida com eles. Desde os pais, as suas casas da infância, na escola, nas profissões. Os amigos estão sempre em dívida, a família também. Os colegas de trabalho devem, as empresas onde trabalham são da mesma forma devedoras desses “credores universais”.

O país deve para eles, seus amores são sempre insuficientes pagadores. Em síntese as pessoas convictas de serem os credores do mundo vivem como vítimas, sempre apontando culpados e culpas pela sua imaginada infelicidade. Por outro lado existem seres humanos que passam pela terra com sentimento de dívida. Agradecem e retribuem ao bairro onde cresceram, aos pais mesmo quando são ignorados, oferecem o máximo e o melhor de si onde quer que estejam sob quaisquer circunstâncias. Jamais se esquecem de todos com quem cruzaram as múltiplas fases da vida e se abastecem desses valores humanos como fonte inesgotável dessa capacidade de doação.

O primeiro patrão, a professora do fundamental, a vizinha que o chamava para um pedaço delicioso de bolo num final de tarde. Essas pessoas que vivem na contabilidade dos que devem ao mundo me lembram de uma música antiga de Geraldo Vandré que dizia: “fica mal com Deus quem não sabe dar, fica mal comigo quem não sabe amar”. Também esses “pagadores de promessas”, pelo simples fato de existirem, me relembram da frase inesquecível de Winston Churchil , na segunda guerra mundial, enfrentando o então considerado exército imbatível da Alemanha nazista, com recursos limitados da Inglaterra. Ele disse: “nunca tantos deveram tanto a tão poucos”.

Temos aí nessa “contabilidade dos vivos” uma equação de entradas e saídas que requer imersões profundas para um justo equilíbrio dessas “contas”. Uma estimada amiga costuma ficar indignada com o que ela chama dos “indolentes”, pessoas do lado “credor” dessa contabilidade que se acomodam sob a força dos que se sentem impelidos para doar ao mundo e a todos, os “devedores”. Ela os chama dos “encostados”. Goleman, criador da inteligência emocional, apresentou num congresso da Caliper, nos Estados Unidos, a proporção do comportamento humano perante a vida: 11% engajados, 19% aderentes ao engajamento, 50% turistas passando tempo no planeta e 20% terroristas detonando tudo.

No meu último livro “O poder do incômodo” (editora Gente) também escrevi que “se não conquistarmos os indiferentes, não iremos acelerar as necessárias mudanças de dignidade da vida humana na terra”.

Desta forma é necessário repensar a estratégia das pessoas que atuam com forte sentimento de doação e de dívida com a vida e o planeta como um todo. Não basta ser um aguerrido doador, ter um compromisso de alma com o aperfeiçoamento das imperfeições, é preciso criar guerreiros para a vida e não permitir que o lado que imagina viver como credor de tudo e de todos se acomode sob sua benevolente guarda. Ao permitir isso estaríamos, sem querer, contribuindo para retardar a evolução dos “credores” eternamente insatisfeitos com as entradas na sua contabilidade cujas saídas são sempre gigantescamente mais exigentes. Também a origem do ódio, da raiva, do crime, do populismo nefasto político, na manipulação das massas humanas, tem nessa ilusão da população “credora” a maior alavanca do espírito do mal.

E aqui, amigas e amigos, quando mergulhamos dentro de nós, chega uma hora que o balanço da contabilidade da vida, os números invisíveis que lideram a alma e os lucros e perdas entre os vivos, possa nos obrigar a parar e repensar todas nossas relações e estabelecer limites ao risco desse “life accountability score card”: tenho sido um devedor do mundo ou um credor? Sinto necessidade permanente de doar o máximo de mim para tudo e todos, ou estou sempre com o sentimento de que tudo e todos devem para mim?

Se você estiver no lado das entradas dessa contabilidade, o gerador da prosperidade e riquezas, da bondade e do amor, excelente, mas estabeleça limites de cargas, e inicie uma análise mais racional do quanto você pode estar mantendo “indiferentes e terroristas” abastecidos com seu suor, amor e lágrimas.

E se você estiver no lado dos credores do universo, onde a autovitimização e a culpabilização fazem parte constante de seus pensamentos, palavras e atitudes, preste atenção e busque aperfeiçoar esse sentimento de infelicidade para si e para muitos, inclusive para aqueles que você diz amar, até os seus próprios filhos.

A responsabilidade não permite que a liberdade escape sozinha. Porém a liberdade também não deve permitir que os responsáveis carreguem sozinhos as cargas da “contabilidade dos vivos”. Devedores e credores está na hora de renegociar o balanço deste viver.

José Luiz Tejon, Prof. Dr. e escritor (“Guerreiros não nascem prontos”; “O poder do incômodo”; “O voo do cisne”).

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