Eldorado/Estadão - A agropecuária tem salvo a lavoura da economia nacional. Em 2022 ficará mais difícil
Publicado em 20/08/2021
DivulgaçãoPlanejamento estratégico no agronegócio diminuiria a crise? Falta consciência de crise. Agosto de 2020 a Abras - Associação Brasileira de Supermercados apontava que não conseguiria mais repor pelos mesmos preços os estoques dos itens básicos como arroz, feijão, lácteos, óleo de soja.
Houve uma reunião com a Conab, na época, onde fui convidado a participar. O presidente da entidade à época era Guilherme Bastos que foi substituído semanas depois. Estava evidente que a crise mundial com a pandemia já assinalava alta nas commodities e nos alimentos. Tinha início a subida dos preços internacionais em dólar, e seus reflexos no mercado interno.
Para piorar tudo, objetivávamos atingir uma safra potencial 2020/21 de mais de 270 milhões de toneladas de grãos, e pela última estimativa da própria Conab deveremos ter no máximo 254 milhões. Uma queda mínima de 16 milhões de toneladas. E para entortar ainda mais o cenário, assistimos crise climática no ano passado e as piores geadas dos últimos 50 anos neste ano. Da mesma forma neste momento quebra da safra de soja na Argentina, com estoques baixos no Brasil e no mundo.
Passamos a importar milho que neste segundo trimestre teve o preço elevado em 11,9% em dólar perante o primeiro trimestre do ano, e na comparação do primeiro semestre de 2021 versus o primeiro semestre de 2020, o milho subiu em real 77%. Outros produtos no mesmo período subiram soja 78%, trigo 40%, algodão 75%, arroz 55%. Em dólar o boi gordo subiu 11,3% na comparação do semestre deste ano com ano passado, o porco subiu 65,3% e o frango 24,2%. E para os produtores de proteína animal os custos de soja e milho implicam em graves prejuízos.
Recebi do Sindicato das Indústrias Frigoríficas do estado do Mato Grosso uma nota assinada pelo seu presidente, Paulo Bellincanta, que os frigoríficos podem fechar em Mato Grosso, o que é estranho e curios , pois o Mato Grosso é o maior rebanho do país e o maior estado do mundo produtor de carne e grãos.
Creditam o drama aos preços da arroba do boi, o que levou o preço a subir no mercado interno, com economia ruim e o consumo caiu. Conversei com outras lideranças do estado que me disseram: “os frigoríficos que não exportam e ficam restritos ao mercado interno estão sofrendo com a escassez do boi, com o preço caro e o consumo interno horrível”. Também ouvi: “os grandes frigoríficos que têm operação na China estão muito satisfeitos e limpam o mercado interno para exportar. Os pequenos sofrem. A má gestão é grande e ainda veio a seca, geada é um ciclo pecuário de abate forte de fêmeas até 2019. Mas isso é sazonalidade”.
Então o risco 2022 vem grave. Uma safra menor do ano que fecha agora. Custos elevadíssimos de insumos e ainda uma perspectiva não boa de resultados para a próxima safra 2021/22 , sob o ponto de vista da produção. O professor Afonso Celso Pastore em entrevista ao Estadão (19/8 - B3) afirma que “acabou a euforia. A perspectiva para 2022 é muito ruim e reúne pontos como a inflação acelerada, taxa de juros crescente, impossibilidade do governo gastar mais, câmbio elevado”.
O crescimento do PIB do país repõe o que foi perdido em 2020, e acrescentaria muito pouco. Dessa forma , ao longo da década passada, enquanto a agropecuária brasileira crescia 32,5% em 10 anos, o PIB do Brasil cresceu somente 2,7% no acumulado de 10 anos. A agropecuária ainda salvou a lavoura, mas em 2022 se o país não ajudar, a dificuldade vai apertar. Um planejamento estratégico do agro, que significa 1/3 do PIB brasileiro e tem demanda mundial, gerando renda e empregos, precisaria ser feito com urgência.
Antes tarde do que nunca. Não é responsabilidade do Ministério da Agricultura somente. Envolve todos os ministérios e a sociedade civil organizada. Para isso precisa ter consciência de crise. Muito mais pão, grão, alimentação do que foco na eleição.
José Luiz Tejon para a Eldorado/Estadão.