Eldorado/Estadão - O Brasil precisa da “Ferrogrão“. Precisamos de líderes que coloquem prioridades nos trilhos da nação!
Publicado em 13/08/2021
País sem conciliação, estratégia de polarização, tudo vira judicialização, todo mundo briga e ninguém tem razão, e também sobra para a Ferrogrão. Uma ferrovia conectando desde o Rio Grande do Sul até Itaituba no Pará, e depois a carga seguir em barcaças (idealmente de borracha como propõe o designer Marco Zanini) até o rio Amazonas e dali para o mundo. Agora o trecho em questão conectaria Sinop a Itaituba, com 933 km, seguindo em paralelo a rodovia BR-163, segundo o ministro da Infraestrutura, Tarcisio Gomes de Freitas, que afirmou ao Estadão que esse modal terá o selo verde, por ser construída em área já desmatada.
Conversei com Cesar Borges, vice-presidente da Caramuru Alimentos, também sócio da Rumo em outro trecho da ferrovia. Ele assegura que precisamos de muito mais trens no país, e que se fizermos o cálculo da sustentabilidade e impactos ambientais, será enorme o ganho com a Ferrogrão comparado a 400 caminhões a menos por viagem movidos a combustível fóssil.
Na outra mão de direção cerca de 40 entidades se erguem contrárias ao novo trecho. As entidades afirmam que irá ocorrer desmatamento, ao contrário do que informa o ministro da Infraestrutura, e além disso alegam oportunidades para grileiros, conflitos fundiários e unidades de conservação.
O conflito continua, pois um lado positivo para realizar uma obra desse tamanho se chama interessados investidores. E investidores não faltam, incluindo a Rumo, empresa logística do Grupo Cosan, a VLI Logística, da mineradora Vale, e o Fundo Pátria, dono da Hidrovias do Brasil.
A visão inteira de uma ferrovia, não apenas conectando o Brasil Central, ou o centro do hemisfério sul, o maior estado produtor de grãos e carnes do mundo, o Mato Grosso, mas imaginá-la inteira do sul do país ao norte, quase como se fosse uma original linha do Tratado de Tordesilhas, um pouco mais a oeste, estaria para a logística nacional como a rota da seda estaria para a China conectando a Europa.
Uma obra espetacular com impactos gigantescos na economia, no PIB do Brasil, no agronegócio, indústria, comércio, serviços, empregos, sem prejuízo aos caminhoneiros que receberiam valores justos trabalhando num sistema modal com maior dignidade de vida, e, se conduzida com bom juízo, tendo selo verde, podemos imaginar ser carbono zero, e suas composições movidas a biometano, produzido nas próprias fazendas ao longo do trajeto, do biogás natural e renovável e com kits de biometanização para os motores como me informou Cristian Malevic, diretor da MWM.
Mas por que tudo isso emperra, passa o tempo, todos brigam, ninguém tem razão?
Um motivo é foco. Precisamos muito mais grão do que eleição. A ausência de capital afetivo nas relações das elites e das lideranças nacionais tende a termos muito mais briga de rua, tapas sem beijos e palavrão. Dessa forma brigar parece ter virado a moda nacional número 1, num país com cultura muito mais conciliadora do que irada e raivosa, porém a guerra está presente na política, na ideologia, nas entidades, e a falta de confiança não transforma a boa discussão e o válido conflito em criação.
Por isso, caberia aos três grupos empresariais interessados, se unirem para realizarem essa obra pelo bem do país, e cooperando para competir entre si. Ao governo caberia pacificar e conciliar muito mais do que transformar os “outros" em inimigos virais.
Às confederações nacionais empresariais caberia se reunirem para explorar os benefícios de uma Ferrogrão, do norte ao sul, num país onde apenas 15% do transporte é ferroviário, e a competição do futuro será decidida pelo custo do quilômetro transportado e no padrão ESG. E no agro podemos dobrar de tamanho em 10, 12 anos.
E às ONGs, universidades, Embrapa Meio Ambiente, especialistas como Dr. Raoni Rajão, Sonia Chapman, outros, caberia um estudo completo de sustentabilidade do berço ao berço avaliando e endossando para valer uma ferrovia e um modal com barcaças carbono zero. Colocar razão na emoção. Quantificação.
E ainda às Organizações dos Direitos Humanos, com OAB, Justiça e Cidadania, reunidos aos demais, esclarecerem o que é justo e constitucional sobre unidades de preservação e terras indígenas. E aos criminosos ambientais e grileiros, muito simples lei e cadeia, nada mais!
Portanto, Ferrogrão, ferrovia Norte-Sul, uma transformação de integração vertical do Brasil, acessando o planeta inteiro. Só precisamos de lideranças conciliadoras onde o bem do país seja o motivo e o sentido superior de vida de todos os envolvidos nessa decisão. Quer dizer, mais grão e menos eleição, e com crise hídrica não podemos mais “chover no molhado“. O tempo para perder tempo já secou.
E toca Raul Seixas. “Olha o trem... Olha o mal vem de braços e abraços com o bem num romance astral“. Mal ou bem? Depende de nós.
José Luiz Tejon para Eldorado/Estadão